
Publicado em 15/01/2014.
O jornal O Estado de São Paulo publicou recentemente que apenas 1% das empresas conseguiu se reerguer após a entrada em recuperação judicial no Brasil. Desde que a lei foi criada, em fevereiro de 2005, até o último dia 10 de outubro, cerca de 4 mil companhias pediram recuperação judicial, mas só 45 voltaram a operar como empresas regulares. No decorrer desses oito anos e meio, só 23% delas tiveram seus planos de recuperação aprovados pelos credores, 398 faliram e a maioria dos processos se arrasta no Judiciário sem definição final. Os dados são de um levantamento da consultoria Corporate Consulting e do escritório de advocacia Moraes Salles, feito a pedido do jornal.
Não é difícil identificar vários motivos para este paupérrimo e previsível desempenho. O primeiro e mais importante é que muitos dos empresários percebem a deficiência do fluxo de caixa de suas empresas tarde demais, e só recorrem à recuperação judicial quando há pouco ou nada mais a fazer. É uma ação derradeira, cujo direito é concedido por lei, para tentar a venda da empresa ou de seus ativos, enquanto o empresário procura proteger seu patrimônio e a si próprio como pessoa física.
Por que estes mesmos empresários não tentam acordo com credores, fornecedores e partes relacionadas, fora do processo de recuperação judicial?
Porque muitos deles são arrogantes. Não lhes convém sentar à mesa, admitir erros e pedir ajuda perante tantos interlocutores. Preferem continuar errando sozinhos até o fim. Alguns têm ainda o objetivo de revidar uma agressão que nunca sofreram, tratando os credores como seres intransigentes, e não reconhecendo o fato de que foram estes mesmos credores os únicos a acreditarem na empresa em dado momento. Além disso, a leis protege, pois diferentemente do “Chapter 11” na lei de falência dos Estados Unidos, os planos de recuperação aqui são elaborados pelos sócios e acionistas das empresas, que tem o poder de veto a qualquer plano que não seja o elaborado por si próprio. Os credores não podem propor um plano à revelia do dono da empresa, mesmo quando a empresa tem seu patrimônio líquido negativo, o que significa que, contabilmente, a empresa já não mais pertence ao sócio ou acionista.
A inclusão da possibilidade de aprovação de planos de credores pela justiça, e não pelos próprios donos das empresas, é uma mudança na lei que faria muita diferença no sucesso das recuperações judiciais, pois haveria interessados, de fato, em recuperá-las.
Outro questionamento é quanto aos principais agentes de um processo de recuperação judicial, desde sua concepção até a sua conclusão.
Quem é o primeiro a ser procurado pelos empresários no momento de analisar um possível pedido de recuperação judicial? Um advogado. E será que os advogados estão preparados para dar pareceres sobre a gestão e solvência de uma empresa?
A maioria, provavelmente não, mas eles estão aptos a dizer ao seu cliente que a entrada em recuperação judicial protege a empresa e ao próprio perante a lei, tendo um prazo de seis meses, após a aprovação do pedido, para elaborar um plano, eliminando qualquer risco para empresa e para seus bens pessoais, já que os credores não podem pedir sua falência.
Era tudo o que o frágil empresário queria ouvir, seja por esperança de salvar sua empresa, seja para salvar a própria pele.
Quem faz o deferimento da recuperação judicial? Os juízes.
Será que os juízes também estão preparados para identificar se o caso é de recuperação judicial ou uma simples desmobilização da empresa, vendendo o imobilizado da empresa e aumentando o capital, não resolveria?
Não são administradores, economistas e contadores que entendem de gestão?
Portanto, a recuperação judicial, que deveria ser um processo de gestão e administração das empresas, se torna um processo jurídico, gerido por juízes, advogados e administradores judiciais, faltando a ela, em muitos casos, a figura do gestor, aquele que poderia dar um parecer sobre as reais possibilidades de recuperação e, consequentemente, sobrevivência das empresas, antes da recuperação judicial.
A fórmula de sucesso da recuperação judicial deveria ser R = G x V x I, onde:
R = Recuperação (Judicial ou não)
G = Gestão da empresa
V = Vontade de gerar Valor pelo sócio da empresa em detrimento de seus objetivos pessoais
I = Interesses comuns entre sócios, acionistas e credores
Adotando esta fórmula, um Comitê de Gestão em Recuperação de empresas, com subordinação a definir, criado para diagnosticar a real situação de uma empresa em dificuldade e identificar alternativas e ações de geração de valor, antes do processo de recuperação judicial, poderia evitar a falência de empresas que hoje se excedem em atos jurídicos, porém não sobrevivem por inanição de conhecimentos de gestão.
Sobre o autor
Eduardo Beadle, fundador e Sócio Diretor da B3 Gestão e Estratégia em 2012 (www.b3gestao.com), Economista, MBA em Finanças, com especialização em Restruturação de Empresas, Fusões e Aquisições na Harvard Business School e Recuperação de Empresas (Turnaround) no INSPER. Conselheiro de Administração certificado pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) e membro da TMA – Brasil (Turnaround Management Association).